Domingo passado, dia 14 de janeiro de 2024, a rainha Margarida II “pediu demissão” e o príncipe herdeiro assumiu o trono.
Falando a palavra “coroação”, eu imagino uma cerimônia parecida com aquelas que a gente vê nos filmes: a rainha se levanta do trono, tira a coroa da cabeça, a coroa vai para a cabeça do novo rei, e ele se senta no trono.
Não foi assim.
A programação era:
- 13:45 a rainha sai do castelo Amalienborg de carruagem e o filho sai atrás de carro
- 14h chegada no castelo Christiansborg (que é a casa do parlamento)
- A rainha assina a abdicação e volta para o Amalienborg no carro
- 15h a primeira ministra proclama o novo rei aos súditos da sacada do Christiansborg
- O rei (e sua rainha, Mary) voltam para Amalienborg na carruagem.
De manhã, vi que não estava nem chovendo nem muito vento e a temperatura estava um pouquinho acima de zero, o que já ajuda. Juro que tentei tomar coragem para sair de casa e ir até o centro assistir à proclamação, mas quando vi dez da manhã que estavam entrevistando gente que já estava na frente do Christiansborg desde cedo, fantasiados achando que aquilo era um baile de carnaval, eu imaginei a multidão que iria até lá.
Dito e feito. De tarde diziam toda hora na tv que tinha tanta gente que a polícia teve que bloquear a entrada de mais gente. Então teve gente que não conseguiu ver nada. Ainda bem que não fui.
13:36 eu abri o aplicativo do canal DR e vi que eles estavam mostrando tudo ao vivo. Para minha surpresa, 13:38 o portão do castelo se abriu e a carruagem já estava em andamento. A rainha saiu de casa uns minutos mais cedo do que programado! Que sorte que eu estava online naquele momento, ou teria perdido.
Acabei que fiquei assistindo a tudo online, do conforto do meu sofá, até umas 15:20.
Foi um dia comovente. Todo mundo acenando para a rainha durante o trajeto. A embaixada da França fez uma bandeira enorme roxa com o logotipo M da rainha Margrethe e escreveu a palavra “Merci”. Eu achei muito comovente isso.
Depois veio o vídeo da rainha assinando os papéis da renúncia e os entregando para a primeira ministra. A rainha se levanta da cadeira, acena para o filho sentar. E assim que ele se senta ela diz: Deus proteja o rei.
Eu achei isso emocionante, porque a rainha sempre terminava seus discursos dizendo Deus proteja a Dinamarca, e agora ela disse o mesmo, mas pedindo para proteger seu filho.
E as coisas mudaram não só para o Frederico, mas também para seu filho mais velho, Christian, que agora passa a ser chamado de príncipe herdeiro.
Junto com a equipe de comentaristas tinha um jornalista mais velho que presenciou em 1972 o dia que Margrethe foi proclamada rainha. Ele disse que naquele ano, toda a guarda estava vestindo o uniforme azul, mas que hoje, a guarda estava vestindo o traje de gala, que é vermelho. Uma jornalista mais jovem brinca dizendo que todas as fotos de 1972 eram em preto e branco e não dava pra ver a cor do uniforme. rsrs O velhinho não se abalou com o comentário e disse que o traje vermelho indica que estamos testemunhando uma celebração. (Acho que ele se refere ao fato de ser o dia do jubileu de 52 anos de reinado, apesar dela estar abdicando, e o novo rei será proclamado sem ter tido uma morte na família, ou seja, ninguém está de luto).
Assistindo a rainha Margrethe voltar para o Amalienborg, eu ouvi um comentário que ficou marcado comigo. O comentarista disse que a rainha Margrethe continua sendo rainha, ela só não é mais a rainha regente.
Bom, ela também não vai mais morar no mesmo palácio. O castelo Amalienborg (foto ao lado) é formado por 4 palácios na forma de um octágono. O palácio abaixo na esquerda é reservado para o monarca regente. A rainha Margrethe, depois de abdicar, não pode voltar para esse palácio. Ela foi para um dos outros e vai continuar recebendo um salário do governo, que será equivalente ao salário que a mãe dela, rainha Ingrid, recebeu depois da morte do rei Frederico IX.
Enquanto a gente se preparava para dar 15h, esperando Frederico aparecer na sacada, a tv mostrava a multidão de gente nas ruas. E mostrava a guarda se posicionando embaixo da sacada.
Então a porta da sacada se abriu. Frederico veio sozinho, todo emocionado com lágrimas nos olhos. E o povo animado, acenava. Então veio a primeira ministra e ela explica que ela deve repetir a proclamação por três vezes.
Enquanto ela repetia a proclamação, eu estava torcendo para que ela não errasse, pois é muito fácil trocar as palavras numa situação dessas. Esse foi o discurso dela:
Hoje é domingo, 14 de janeiro de 2024.
Sua Majestade, a Rainha Margrethe II abdicou.
Em nome do Reino, gostaria de agradecer de coração a devoção da Rainha Margrethe.Obrigada por levantar o legado, o dever e a responsabilidade.
Obrigada por nos conectar ao passado e nos preparar para o futuro.
Obrigada por se dar ao trabalho. E muito mais.Cada rainha e cada rei são um elo de uma corrente com mais de mil anos. Quando um recua, o próximo está pronto.
E o Príncipe Herdeiro, que agora será nosso regente, é um Rei que conhecemos. Um rei com quem nos importamos. Um rei em quem confiamos.
Ao saudarmos o novo chefe de estado da Dinamarca, e desejando felicidades para a sua vida e trabalho – e, portanto, para a Dinamarca – devo, de acordo com o costume do Estado dinamarquês, exclamar três vezes:
Sua Majestade a Rainha Margrethe II abdicou.
Viva Sua Majestade o Rei Frederico Décimo!Sua Majestade a Rainha Margrethe II abdicou.
Viva Sua Majestade o Rei Frederico Décimo!Sua Majestade a Rainha Margrethe II abdicou.
Viva Sua Majestade o Rei Frederico Décimo!Uma vida nove vezes maior para Sua Majestade o Rei.
Viva, viva, viva, viva
Eu imagino que em 1972 a proclamação foi assim: “Sua Majestade o Rei Frederico IX morreu, viva Sua Majestade a Rainha Margrethe II”. Quem sabe quando eu estiver velhinha eu vou assistir à proclamação do futuro rei Christian XI.
Mas voltando ao assunto… Em seguida Rei Frederico X fez um discurso comovente. Daí Mary veio se juntar a ele na sacada e uns minutos depois vieram os filhos. Ficaram ali uns 8 a 10 minutos e depois entraram no castelo e fecharam a porta da sacada.
Eu estava pronta para me levantar do sofá quando vejo que eles reabrem a porta da sacada e começa tudo de novo, Frederico acenando, depois com Mary, depois com os filhos. Parecia até concerto de música ou peça de teatro, que depois que fecha a cortina, o artista volta para mais uma rodada de aplausos. Meio palhaçada, mas tudo bem. A gente dá um desconto porque para eles esse foi um dia especial. Num momento rolou até um beijo entre o casal de pombinhos (se bem que o que me veio à cabeça foi o escândado da infidelidade com a mexicana).
Depois acompanhei eles voltando para o Amalienborg de carruagem e chega.
No dia seguinte, segunda-feira, foi o primeiro dia do novo rei no parlamento. Eu achei interessante que, no primeiro dia de trabalho do rei, a Rainha Margarida estava lá e ela se sentou atrás de Frederico. Isso sim é que é sorte, trazer mamãe para o primeiro dia de trabalho!
E a história não acaba aí. Três dias depois da coroação, Frederico publicou um livro, assim, de supetão. Pegou todo mundo de surpresa.
Não sei bem do que trata o livro, acho que sobre a posição da Dinamarca no mundo e sua vida com a Mary. O título é Palavra do Rei e o livro está sendo vendido na DK por 250 coroas, o que é um preço relativamente alto. Normalmente eu compro livros que custam menos de 120 kr.
Também se fala muito na rainha Mary. De como ela é a primeira rainha do mundo nascida na Austrália, e a primeira rainha, na história da Dinamarca, que era uma cidadã comum, ou seja, não vem da nobreza.
Termino esse artigo com o discurso do Rei Frederico X no dia da coroação. Ele colocou seus óculos para ler o texto. Eu teria lembrado daquele texto de cor e salteado. rsrs
Eu gostei do discurso. Foi curto. Aparentemente discurso na Dinamarca não fica naquela lenga lenga.
A minha mãe, Sua Majestade a Rainha Margarida II, governou a Dinamarca durante 52 anos.
Ao longo de meio século, ela acompanhou os tempos tendo como ponto de partida a nossa herança comum. Ela será para sempre lembrada como uma regente extraordinária.
Minha mãe, como poucos, conseguiu se unir ao seu reino.
Hoje, o trono passa adiante.
Minha esperança é me tornar o rei da união de amanhã. É uma tarefa que tenho abordado durante toda a minha vida.
É uma responsabilidade que assumo com respeito, orgulho e muita alegria. É uma ação que farei um esforço para levar adiante a confiança que encontro.
Precisarei de todo o apoio que puder da minha amada esposa, da minha família, de vocês e daquilo que é maior que nós.
Encaro o futuro com a certeza de que não estou sozinho.Conectado, comprometido – para o Reino da Dinamarca.
Que mundo de gente!
O rei é marqueteiro pelo visto, aproveitou a comoção da coroação para vender o livro, rs
Pergunta: o que você acha da monarquia?
Rei marqueteiro! hahaha essa foi demais!
O que eu acho da monarquia? Quando vim pra cá eu não entendia o valor disso já que é o parlamento que toma as decisões. O rei tem poder de veto, mas não fica bem se ele for contra o parlamento que o apoia e que decide o seu salário! Eu achava um desperdício de dinheiro ter rei e rainha só de decoração, mas depois eu vi o quanto a Rainha Margrethe trabalha. Essa mulher não tinha descanso. É muito tempo que ela usava mantendo e construindo relações diplomáticas. Mas eu tenho um carinho especial pela Margarida. Não sei se vou sentir o mesmo pelo marqueteiro. (eita, que esse apelido veio pra ficar!)
hahahahah…
Entendo… eu sempre achei um pouco absurdo alguém ter uma posição assim, simplesmente porque nasceu em determinada família.
Além dessa construção de relações diplomáticas, eu li que na Inglaterra o lucro que a monarquia traz é maior que os gastos, será verdade? rs
Interessante essa informação. É possível, não? Investimentos ou coalisões com outros países? Se bem que depois do Brexit a Inglaterra ficou meio isolada. Mas talvez essa seja uma impressão minha. (No final das contas, política não é minha praia, rsrsrs)
Thank you for your impressions, explanations and pictures of the abdication of Queen Margarethe and the coronation of her son.